Redes Sociais
Mais Informações
Menu
“Aqui não é permitido envelhecer.” – Armando Cortez
por Maria Helena da Bernarda
(publicado a 5 de agosto de 2023)
UMA CASINHO NO CAMPO
“Fiz 60 anos, os últimos 18 como colaboradora da Casa do Artista. Isto foi um céu que se abriu numa altura muito difícil da minha vida…
Em 2005 estava a passar por uma depressão, consequência de vários factores. A minha mãe tinha falecido 5 meses antes, vítima de cancro, tendo sido eu a sua cuidadora durante 6 meses a fio, noite e dia. Eu tinha marido mas não muita saúde e não consegui gerir o culminar desse processo, um misto de desgosto e exaustão.
Tive o apoio de uma médica muito amiga, como família, filha do Henrique Santana e da sua mulher, Maria Helena Matos, em casa de quem trabalhei mais de 20 anos como empregada doméstica. Chamavam-me afilhada e inclusive viajava com eles. Eram como meus pais.
Saíra do Carvalhal de Abrantes aos 18 anos para servir em sua casa. Só tive electricidade na minha aldeia aos 11 anos; no verão, tínhamos um tanque que fazia de piscina; o campo imenso para brincar em liberdade. Tive, afinal, o principal: fartura na mesa e uma infância feliz.
Quando a filha do Henrique Santana soube que vinha trabalhar para aqui, riu-se e disse-me que estava destinada a cuidar de idosos.
O Sr. Henrique faleceu comigo no Hospital da Cuf, em 94. Eu ficava lá de noite a acompanhá-lo. Continuei a cuidar da Dona Helena, que faleceu praticamente nos meus braços, em 2002. Nessa altura fiquei sem trabalho, o que também me abalou. Dois anos depois faleceu a minha mãe.
Quando o telefone tocou, ouvi a voz de uma senhora amiga da Dona Helena e voluntária da Casa do Artista, informando que a Dona Manuela Maria estaria necessitada de uma pessoa com as minhas características. Receosa, aceitei vir à entrevista. Em boa hora o fiz. Estando a tratar-me de depressão, abandonei logo a medicação e posso afirmar que o trabalho foi a minha melhor terapia.
Vim como assistente administrativa e, desde há 12 anos, sou Encarregada dos Serviços Gerais, gerindo a equipa de limpeza e produtos associados.
Trabalho bastante, mas em casa também não descanso. Lá, tenho o marido e a minha sogra debilitada, de quem sou também cuidadora.
Sou muito de afectos, mas confesso que às vezes ando tão cansada que só sonho com o que já tive: uma casinha no campo.” (risos)
Fotografia: Mª. Helena da Bernarda